sábado, 29 de janeiro de 2011

Novamente me vejo lutar em direção oposta. Todos vocês dizendo o que eu tenho que ser, o que eu tenho que fazer e mais uma vez eu ouvindo vocês, pacientemente, torcendo pra que outra vez esse amor involuntário que eu sinto por poucas pessoas que me cercam, seja capaz de não sucumbir e entender que eles só querem o meu bem. Agora eu me pergunto: E se eu quiser o mal?

Partir sem lugar. Correr sem certeza de uma chegada. Enlouquecer a ponto de não ter camisas de forças para me conter. Porque é assim que eu tenho me sentido a cada palavra de cuidado que vocês me jogam e eu recebo como se fossem canivetes a cortar todo o meu corpo. Mais uma certeza de desconfiança.

Eu sei que vocês zelam por mim. Enquanto eu durmo, no nosso sossego. Enquanto eu corro, sem desviarem os olhos. Enquanto eu parto, enviando mensagens de qualquer forma. Só que talvez o que eu tenho precisado é viver sem seus olhos curiosos, atentos, zelosos, pretendendo me puxar de cada buraco que eu entro. Alice não precisou de mãos para socorrê-la. Maria viu seu filho morrer sem ninguém ao lado dela pra dividir a certeza de que ele era inocente. Elis escolheu outra vida e todos tiveram que aceitar. Talvez não confiem em mim o suficiente; Nessa minha vontade inconsequente de não voltar mais; de cair sem rumo; de chorar por alguém que se foi até as lágrimas secarem; de mergulhar as dores em busca de uma paz que só se tem quando se nega esse mundo.

Não estou aqui para justificar a minha necessidade em me livrar de tanta atenção. Só cansei dessa luz com potência de mil holofotes em mim. Se grito é porque me sufocam; se choro, é porque me espremem; se canto, é porque necessito fugir. Se escrevo é porque não encontro forças pra falar dessa dor que me corrói ao saber que dói mais em vocês não conseguirem me fazer parar. Ouçam essa minha voz sufocada pelo nó na garganta. Leiam essas minhas palavras enroscadas em entrelinhas. Eu não quero parar. Se o amor de vocês for tão forte - e eu sei o quanto ele é - vocês entenderam; me deixem livre porque o meu maior orgulho é saber que a liberdade ainda pode me habitar, por mais que meus olhos fechem por alguém e meus pés insistam em dançar por tijolos que não reconheço mais.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Meu coração parou. Por alguns segundos eu desejei não estar onde eu estava, não ver o que meus olhos estavam sendo cúmplices, não sentir as minhas mãos suarem; e, novamente surpreendida pelo acaso, resolvi entrar e enfrentar a dor da perda. Após atravessar o grande corredor pálido ocupado por pessoas que encarnavam ainda mais essa condição, quando não no rosto, nas roupas, perguntei por Maria, a minha tão lúcida Maria.

- No box 5 - respondeu-me um senhor carrancudo, de pele enrugada e óculos grossos que impediam qualquer tentativa de diálogo entre olhares. Deve ser mais fácil para eles não olhar nos olhos quando trazem más notícias.

Percorri mais 5 metros procurando pela minha razão, logo a encontrei. Deitada, triste e frágil como não lhe era comum. Respirei fundo, coloquei a mão no peito pra ver se os batimentos voltavam e ensaiei uma frase de calmaria em pensamento antes de lançar qualquer palavra em sua direção. No chão, restos do seu mal estar davam um colorido de tom amarelo pastel aquele lugar tão branco.

- Fica tranquila, meu amor. Você vai ficar bem, agora... - Disse com a voz um pouco trêmula que ainda não havia se recuperado do susto. Ela abriu os olhos pequenos devagar e por um instante pensei ver um sorriso, mais uma vez ela tentando ser forte quando só precisava chorar.

- Minha boca...eu não sinto. - Eu que há tanto tempo não sentia o coração gostaria de estar no lugar dela agora. Amparada pelo silêncio que me é mais conveniente quando desejo falar o que sinto e não o que penso, corri a procura de alguém. Segundos depois, um jovem, de voz forte, cabelos raspados, altura mediana, olhos gentis, veio ao nosso socorro.

- Tudo bem, dona Maria? Eu vou fazer um soro na sua veia agora e preciso que você me ajude fechando o punho direito e segurando até eu pedir que solte. - Ela, apegada a segurança que eles da saúde nos passam quando querem, fez o que ele pediu, sem arriscar uma palavra. Com uma luva cirúrgica, ele amarrou acima do cutuvelo dela e aproveitou a pressão para encontrar o caminho da sua cura. Eu, confiante que estava, apenas observei tentando não desconcentrá-lo.

- Pronto. Agora você tem que cuidar pra não sair da veia. - Ele me olhou com aquele olhar seguro de quem já fez isso cinco mil vezes pra talvez se livrar do meu olhar de insegurança e observação e disse saindo do local: - Qualquer coisa, não hesite em nos chamar. - Agradeci com um sorriso pequeno e me aproximei dela para lhe cobrir a seu pedido.

Depois de vê-la corar um pouco, sentei-me na cadeira localizada a frente da cama e abrir meu exemplar de "A manhã seguinte sempre chega" procurando por alguma crônica que eu ainda não havia lido. Por ironia, li o seguinte trecho: "Sabe doutor, conheci uma menina aí. (...) Já te aconteceu de trombar numa menina assim? Assim, doutor, que te faz voltar a sonhar, então tu hesita porque sabe que o sonho não sairá como tu sonhas?"

Claro que nessa hora eu fechei o livro. Olhei ao redor. Branco e mais nada. Não é por nada que pessoas enlouquecem nesses lugares. Uma enfermeira baixinha e de sorriso largo veio ver como estava dona Maria e aproveitou pra refazer o caminho do soro, pois o outro havia se perdido. Agora, com uma das mãos ligadas aquele caninho transparente onde cai gotinha por gotinha e salva corpo, alma e coração, a cor dela voltava sem que eu me iludisse como em instantes atrás.

O doutor, não o do livro, o que havia receitado duas doses de soro, uma de glicose e mais três combinações de diferentes remédios, também chegou pra terminar de desenhar um sorriso pequeno em meu rosto, pois consigo trazia uma pouco mais de tranquilidade.

Como havia desistido momentaneamente do livro, tentei as mensagens de celular. Falei com algumas pessoas distantes em kms, outras distantes em coração. Também desisti do celular. Achei refúgio na música. Tocava Los Hermanos em meus ouvidos distraídos quando senti um frio nas costas. Logo depois, havia um bilhete com uma letra de forma sinalizando que até nos lugares mais improváveis, o amor acontece. Amor? Bom, meu coração mal havia se recuperado de um susto e já se encaminhava para outro. Que ousadia a dele! E a minha em aceitar. E a nossa em se encontrar.

Agora, a beleza fria de Maria, estava quase pronta para outra. E eu, ainda surpresa pelas coisas que podem te acontecer quando você não está esperando resolvi dar outra chance para o livro, fui ler o final daquela crônica, que dizia assim:

"- Que aparelho é este?
- Um desfibrilador.
- E por que tens um desfibrilador no seu consultório, doutor?
- Porque sou cardiologista, não psiquiatra. E eu posso precisar reanimar o coração de algum paciente em estado de urgência.
- Vou anotar o telefone dela, caso enguice essa tua parafernália aí. Ela também desfibrila corações em estado de urgência. Desculpa a anedota doutor, a gente fica bobo quando está apaixonado."

Foi então que eu percebi. A gente só precisa de um choque. De uma surpresa. Um chute. Ou até mesmo um simples olhar, um toque. Quando você está distraído demais pra notar o mundo gritando ao seu redor a cena pode passar milhões de vezes por você que você não vai parar pra vê-la. Agora, ouse sentir perder alguém que você estima para ver o quão sensível você se torna aos sussurros do mundo. E aí, vem um outro alguém pra te dizer que não é um desfibrilador que vai trazer seu coração de volta, mas o simples ato de te notar quando o mundo inteiro parece não te ver.

sábado, 8 de janeiro de 2011

É bom ter tempo pra pensar nas coisas que você não teve tempo pra rever ano passado. Repensando, eu percebi que isso que dizem do mundo conspirar fez muito sentido no ano de 2010. É engraçado, é irônico, é vida. Como naquela vez em que você apareceu justo quando ele foi me buscar. E eu, com os joelhos machucados demais, não pude fugir, nem dele, nem de você. Você poderia aprender com ele a não me fazer chorar. E ele podia aprender com você a me fazer apaixonar. Mas como só eu conheço os dois, desse meu modo fugitivo e, por isso carente, fico imaginando como seria trocar vocês dois de lugar.

Será que eu ainda teimaria em gostar de você caso você estivesse no lugar dele? Quando eu estou com ele, sinto-me amada, segura, incompleta. Quando eu estou com você, sinto-me amada, insegura, completa. Podia ser apenas uma questão de prefixo. Só que é dúvida. E pior, a dúvida funciona, é a minha sina, diriam outros. Será que não saber se você vai continuar na manhã seguinte é o que me mantém te querendo na manhã anterior?

Eu sabia que iria receber uma mensagem sua quando estivesse com ele. Por isso coloquei o celular no silencioso e na manhã seguinte eu sabia que ainda iria te ter. As mensagens eram como dois avisos, o primeiro, de que você estava pensando em mim, e o segundo, de que após eu as ler, teria certeza de que era você que deveria estar dormindo comigo. Ele é a paz que você me roubou. A certeza do sono durante a noite e não do desejo repentino da madrugada. Juntos são opostos que me distraem. Só que ele me distrai do que eu sinto por você e você me distrai do que eu sinto por mim.


segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

...prever o futuro é pretensão de quem sabe amar. Mas não sabe que amar é não saber.
Gabito Nunes

Previsões. Assim como as do tempo, falham - em um instante - na primeira mudança da frente fria que ia para o norte e acabou perdendo força e estagnando antes ainda de sair do sul. E todos acreditam. Fazem planos para uma tarde ensolarada no campo e quando chega o dia escolhido, o céu de azul passa a ter tom cinza escuro com sons de tempestade fresquinha sem vontade de acabar tão cedo.

Eu previ. Previ tanto meu tempo contigo fazendo chuva, fazendo sol, que te perdi antes mesmo da frente fria mudar seu curso. Mas, não pense você que apenas eu senti sua falta. Porque você perdeu a minha entrada para a vida adulta. Perdeu minha primeira lágrima quando parti para morar sozinha. Você perdeu minhas viagens durante a faculdade, minhas noites de insônia falando ao telefone com alguém que não era você, minha superação do meu medo de escuro, minha primeira ida ao médico por medo de ter alguma doença realmente séria. Se dói aqui, doeu aí também.

E porque os tempos mudam, você voltou. E voltou justo na hora que eu mais precisava. Voltou quando eu me perdi. Queria que você estivesse aqui pra me ver crescer e o quão rápido isso modificou meu jeito de ser, meu modo de agir e até minha resistência para chorar. E talvez, seja muito duro para você lidar com a pessoa que eu me tornei. Às vezes fria, outras inconsequente, só que muito mais protegida. Não pelos seus escudos imaginários que você deixou quando partiu, mas pela minha própria força de mudar. Afinal, assim como mudam os tempos, eu mudei também. Ela era doce e ingênua. E dentro de mim eu sinto, você vai saber lidar muito bem com isso. Mas como todas as previsões e sonhos mudam resolvi apostar. No fim, só se sabe quando não se quer realmente saber. Só se encontra quando não se quer encontrar. E você é a prova disso.