Parece mesmo que eu ando tendo tempo
de sofrer. Arrastando os dias pra não me livrar das últimas lembranças felizes de
nossas vidas. Parece mesmo que o tempo não passou. Todas as noites em que o som da
chuva bate na janela penso no último dia que estivemos emblemáticos,
sorridentes, tentando se lembrar de alguma dose boa de nós. Eu nunca mais
chorei a tua falta. Fico sem reação quando leio teu nome na tela. Ouço os meus dedos
tocarem de leve as teclas interrompidos por uma sensação fragmentada de
amor. “Amor sem palavras. Ou. Palavras de
amor sem amor”. Sinceramente, eu não sei. Parece mesmo isso aqui um beco. Corri
tanto que ultrapassei os sentimentos, mas sei “sei que respiro” nessa corrida sem lógica. Tentei por todas as
vezes não
abandonar o lado racional da vida, mas parece que tu estiveste a voltar nos
momentos em que estive mais perto de compreender a ciência, só pra me deslocar
do conforto que é não
sentir. Tu fode com a minha mente. Metodologias, objetivos, dados e tudo isso
pra que? Chegar ao final e entender o pedaço ínfimo de sorrateira incompletude que somos?
Compreender cada vez mais que fomos nada diante de tudo. “Oh, pedaço de mim, oh metade afastada de mim”. De todos os julgamentos, esse tem sido o
mais difícil de enfrentar. Talvez só seja o momento. Eu não quero mais
enfrentar a oscilação,
os desencontros, ou esse sentimento de que alguma coisa tem que morrer em mim
para que outra nasça.
Eu só queria não
ter mais que rejeitar a ideia de tua volta. Então, não volte nunca mais. Permaneça quieto, permaneça longe. Enquanto
eu caminho em direção
ao nada que construí para os meus dias. Desconfortavelmente. Sem ti. E te peço, por favor, não me ligue mais
quando a noite cair por cima dos teus ombros. Não me ligue mais quando sentires que sou a
única que pode afagar tuas dores. Não me procure mais quando surgir um sorriso em
meu rosto. Não
me chame ao anoitecer, não
me acorde da vida que inventei pra mim. Demorou muito tempo pra que eu
conseguisse compor todas essas notas libertas de dor. Demorou muito para que os
pássaros me acordassem da tua ausência. Então, imploro, não encoste em mim com as tuas mãos frias, teus
olhos carentes, tuas rugas, teus vícios, tuas inconstâncias. Me deixa
dormir em paz; já faz tempo demais, o que não faz é sentido. Sem te ter tido eu fui menos
minha. Estive, por todo esse tempo, muito mais ao teu lado. E mesmo dizendo
adeus diversas vezes, voltei porque acreditei demais no que foi vago.
i l u s ã o