quinta-feira, 15 de março de 2012

nós

tu era a representação do limiar entre a razão e a emoção. de um lado, todos os meus anseios de luta e desejos de conquistas. do outro, a confortável certeza de uma respiração junto da minha. um me daria o confronto das ideias, experiências adquiridas em viagens sem rumo, aventuras tal qual viveram todos aqueles que me inspiram. outro, o chão que eu precisaria ter se quisesse um dia voltar, as vozes das crianças de manhã, o cheiro da erva fresca pela tarde, o som do violão tocado pelas tuas mãos. mas como toda a representação, também tu foste fruto de uma projeção minha. hoje não te vejo mais andando nessa linha, te vejo onde sempre estiveste, habitando teus rumos, procurando saber mais de ti. não há mais linha: desatei os nós.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Inspira

É que tapei meus ouvidos e pude sentir o interior do meu corpo inteiro concentrado em uma só parte. Lembrei de respirar umas duas, três vezes e depois contei até sessenta prendendo a respiração o máximo que pude. Sessenta segundos debaixo das sensações ofuscadas pelo cotidiano e talvez pelo tempo que tirou de foco. Um minuto de solidão. Ainda pudia sentir o toque como se meus trezentos e sessenta e oito minutos restantes de vida não fizessem diferença senão por aquele momento. Por trás do toque, mais trezentos e sessenta e nove desejos, angústias e malabarismos imaginários. Parece que a angústia de nunca ter certeza continua a mover a minha vida como um trem desgovernado que se perdeu nas entrelinhas do trilho. Parece que tudo aquilo que parece perde o sentido de existir como possibilidade naqueles sessenta e um segundos de toque. Eu juro, gostaria de ter parado. Não sei se ainda posso explicar a minha velocidade para os observadores do mundo. Só sei que fiquei porque ao que parece, gosto de parar um pouco. Ou parar é tudo aquilo que odeio e a dor, "a gente vira dor pra não ter que virar fim".

domingo, 4 de março de 2012

ar, me falta ar.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Laura

"Sim, eu estou tão cansado, mas não pra dizer que eu não acredito mais em você...
Sim, eu vou tomar aquele velho navio, aquele velho navio"

Fiquei sentada algumas horas pensando no nome da personagem principal dos meus anseios. Tomada pela ânsia e pela ousadia do sentimento de liberdade cortado no meio. Até que ponto essa vida é menos prisão? Gostei de Laura. Eu sempre gostei de Laura. Ela tinha uma faísca nos olhos que não deixava transparecer seus sentimentos cômodos. Laura tinha tudo para ser mais uma burguesinha vivendo a era da "mania de libertação", onde noites boêmias eram uma fuga dos padrões de vida da classe média. Entrou em confronto direto com seus pais, perdeu a esperança nos mais próximos, falou atoa aos quatro ventos, assistiu peças de teatro e leu as críticas na mídia alternativa. Laura não era diferente das milhares de meninas que se encantam pelo mundo visto com lentes de aumento. Ou pela ideia de ver o mundo de uma forma diferente. Só que quando Laura voltava para casa, ela não queria deixar de ser a menina que tinha se transformado. E sem ninguém que compartilhasse as mesmas ideias, ela era apenas a menina que saiu de casa mais cedo pra não ter uma família. Ninguém entendia que estudar para ela significa muito mais que uma mudança de posto nas estatísticas econômicas do governo. Estudar era admitir a vontade de sentir dor. Lembrou, por vezes, das palavras de sua amiga de infância: "Quando eu descobri que estudar indignava, resolvi que preferia dormir". Só que para Laura, não tinha mais volta. Por insistência, por gostar da solidão, por não ver sentido na vida, por ser naturalmente inconstante e por fim, por todos aqueles motivos que lutam os que ainda lutam. Por que será que alguns têm tanta disposição para escolher a dor?

- Agora me diz, espelho meu, existe alguém mais masoquista do que eu? - Seus olhos fecharam enquanto mais uma madrugada quase que insone informava a Laura que as suas escolhas não importam pro mundo, estão, na maioria das vezes, predestinadas a morrerem consigo.

E o sentimento de morte é o que se leva da vida.