sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

domingo, 25 de dezembro de 2011

Noite de vésperas

- Vinde a mim as criancinhas.

E repleta de crianças eu era mais feliz (ou menos cética).

Escrevo hoje para reverenciar o eco que clama por uma voz inexistente.

- Onde estás que não aqui?

Não te encontro se não me esforço (com dor) para revirar memórias e cansaços.
Já faz algum tempo, parei de pedir pra ti e comecei a perguntar por ti.
E nesse esforço pendente por repostas avulsas, lembro-me bem das palavas recentes que mais me marcaram: "A memória é aquilo que fica depois que o esquecimento faz o seu trabalho".
Como lido com tantas lembranças relidas, empecilhos, vírgulas em meu caminho.
Precisava transformar toda essa agonia em água e sal, mas o tempo se encarregou de secar a fonte do meu poço de desabafos e nem lágrimas me são possíveis.
Autuar em degradação papeis, tintas e pedaços.
Para mim, não profetizaram flores e todas essas pessoas cantando em adoração a algo que já partiu só enfatizam a minha impotência diante dos mortos.
Acreditar na não existência deles, não significa estar liberta dos fantasmas que me assombram.
Dia após dia. Ano após ano. Lamúrias e sensação de asfixia perante a inexatidão desse mundo. Pareço estar me acostumando a colocar minhas memórias pra dormir ao lado de meu corpo frio coberto de solitude, todas as noites. E toda aquela história de petrificação a minha vida tem condenado. Talvez seja essa a profecia. Não ouço mais os gritos das crianças desesperadas, não temo mais o vento da volta dos mortos, não sei se quero ser esse soldadinho de chumbo retirado das histórias para enfeitar pinheirinhos de vésperas. Recordo, ainda, a angústia feliz daquilo que antecede. Mas tenho sido vencida pela antecedência, o procrastinado fim daqueles que não se realizam. E no entanto, continuo me antecedendo. E antecedo aqui este começo que nunca cede e que nunca cedo. Por isso escrevo e por isso vivo cada anteceder e nem mesmo acendo porque não mudo e porque não vejo.

Eis meu consolar: "Mas quem sente muito, cala; quem quer dizer quanto sente fica sem alma nem fala, fica só inteiramente".

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

poematizar

Não guarde o poema para si.
O poema nasceu para ser falado...
...pra pular de boca em boca
e unir as línguas...
Os poemas deveriam estar nas bocas das pessoas
e elas poderiam comê-los
engolir palavra por palavra
letra por letra
degustar som por som
até ele passar pelo tubo digestivo
e GRITAR sentido!
O poema encontra angústia quando passeia pelo corpo
e enlaça seus anseios as mãos de sua amada
despertando vontade e exorcizando paixões...
Eu só queria dizer o quanto ouvir poemas
une as distinções.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Por minhas mãos

Me fizeste, como todos os românticos incompreendidos (e carentes de cama e bons tons) um vaso de flores que atiraste pela janela no terceiro mês. Hoje, elas vivem a tilintar cores diversas no jardim subterrâneo das minhas lembranças. E ainda que não floresçam em vida, contentes estão por germinar cadáveres e desfrutarem da esperançosa possibilidade de virem a renascer um dia. E me pergunto diante de todas essas interrupções tardias, como tens cuidado do teu jardim sempre tão infértil e carente de amores reais. Porque ainda que longe, eu sei e sinto, tua busca por algo impossível de se realizar em vida sem cair no convencionalismo monótono da realidade. E a minha dúvida que subverte a lógica de todas as canções (algo que tiveste dom em fazer) talvez seja a única resposta pronta para responder a tua busca e a minha dor. Quando uma vez falei sobre promessas de amor só se realizarem na impossibilidade era pra me consolar do fato de que temos sido impossíveis um para o outro. E também para não temer a falta de possibilidades de outros universos, outras canções, outros toques e cheiros. Porque assim como queres te contentar com o tradicionalismo das relações, eu estou no processo às avessas. Procuro as mais diversas possibilidades pra me livrar da única que me fez querer um dia parar de buscar, em troca de travesseiros brancos com um só vestígio de ar.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011



Pra ver se escrevo

Pra ver se escrevo
já tentei chocolate e café
acelerar o metabolismo
pra ver se sai algumas linhas
mas nada como
ter você perto
e num instante



ter você longe
pra palavra vir
pro tom, pra nós
pra emergir
a tão esperada
emergência
da poesia
satis-feita

sábado, 3 de dezembro de 2011

- Fale mais sobre essa dor

Mas o que faz essa dor permanecer tão forte. E essa angústia e essa tristeza e essa falta de perspectiva, essa oscilação de mundos, esse marejar de sal nos olhos, esses sonhos dispersos, essa dúvida permanente.
Essa volta pra casa sempre esperando encontrar, essa espera cheia de reticência...
Será que um dia vamos encontrar? O poeta sabia dessa dor. Escreveu sobre a asfixia e encenou para um mundo condicionado a ter asma.
Um turbilhão de sentimentos tapados com fones de ouvido. Uma multidão de pessoas silenciadas pela perda.
Será que um dia vamos parar de esperar?

domingo, 27 de novembro de 2011

Você sabe porquê?

Sabe porque eu escolhi você?
porque contigo não é,
porque contigo não fui,
porque não...

sábado, 12 de novembro de 2011

Inflamação

É muita dor acumulada.
Ao passo que a garganta inflama,
O dia passa
O tempo fecha

É muita dor

O professor tem professado professias
Mas não divide o mar em dois
Não atravessa o deserto em 40 dias
Tem asas de cera

E como não é estrela, chora
E mesmo sendo, choraria
Estrelas de cinco pontas
E muitos sentidos

Sente a criança que sonha
O adulto que bate
A avó que cria
Sente sofre sofre sofre sozinho

E chora
Debaixo de chuva,
Diante da presa
Durante os cem mil quilômetros de pés cansados
Perante a sociedade civil
Embaixo dos escudos dos PMs
5 mil professores choram

Ouvimos o caos
Somos calados
Pelo silêncio
Dos outros 100 mil
E por falar em números
Cidades avulsas
De almas frias
Cultuando os seus egos infinitos
Que inflam inflam inflam solitários
E choram

E os discursos choram
e o faminto e o soldado e o poeta
e o escravo o menor abandonado
o guru o pirata o criado mudo

E caladas
elas também choram
e a artista e a adolescente grávida
e a mulher do tempo a cigana
as milhões de formiguinhas aflitas
todas choram

E o mundo
cenário de enchente de lágrimas
continua mudo
e não muda
porque o trabalha-dor
está ocupado demais
trabalhando a sua dor

A d o e c eu.





sábado, 29 de outubro de 2011

os três últimos dias de outubro

outubro nunca foi um mês com tanta importância pra mim. e veja só, outubro passado passou cortando, enquanto outubro presente podia perdurar até os últimos dias do ano. querer estender outubro, não é questão de desejo, mas de extrema necessidade. parece que dessa vez, outubro veio pra levar embora os últimos fantasmas do passado. trouxe com ele os ventos necessários pra expulsar as cinzas que ainda insistiam em permanecer na sala, no quarto e na memória. bendito mês, ou melhor, bendito seja o agora, sem notas, nem calendários, nem datas, nem prazos. quero viver esses últimos dias como um intenso presente e se for pra relembrar, desejo trazer pra mim as memórias dos dias da infância, em que outubro nada mais era do que o mês das crianças, sorrindo aflitas, feito algumas que vi correr morro acima com balões nas mãos, onde a única preocupação se consolidava em não deixar o outro estourar o seu sonho de voar, sorrindo e vivendo a inocência. e picolés, e amarelinhas, e esconde-esconde, imensa ternura de uma vida passada. eu nunca tive pretensão alguma em desviver, mas deixa eu confessar um segredo, por hoje, somente hoje, enquanto o vento entra, o sangue circula, e a música toca, eu quis desvendar nosso intenso presente. conspira, vai, faz meu pranto respirar teu ar. e a distância só me revela o que eu já sabia: nossas fronteiras se desfizeram desde o primeiro encontro. proximidade não tem nada a ver com corpo. viajo nas linhas do tempo que tanto nego pra poder estar, ao menos em mente, perto. e parece nunca ter fim, uma estrada que se faz de agora. somos responsáveis pelos nossos entraves, então vem, diz pra mim o que teus olhos são tão bons em revelar.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

"- Eu espero, de coração, que ela vá mais. Que dias mais sejam incomuns. Que ambas não tenham medo de se tocar quando a vontade vier. E acima de tudo, meu bem, eu espero que você volte a sentir."

- Pri Fierro: tão perto, mas tão distante, você não precisava ir. Longe da minha visão, mas dentro do meu coração.

sábado, 15 de outubro de 2011

E novamente escreveu sem vontade de postar. Eu tenho mil rascunhos dentro de mim. Isso tem me confundido absurdamente.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

o verbo da vez

Narcisar-se, eis o verbo da vez.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

um vislumbre de morte

Têm dias (ou noites) que a mesma terra que te trouxe ao mundo, insiste sorrateira em te levar de volta. Uma energia, feito imã, vai exercendo sobre o teu corpo, uma força tamanha, sem espaço pra salvação. Ou é preciso cair pra se salvar? Tive medo, diante desses vislumbres, senti não ter controle sobre o meu corpo e quis voar. Nessa madrugada, fará um ano do meu segundo vislumbre de morte, meu primeiro voluntário. Um ano da noite em que as árvores me chamavam enquanto risadas serviam de sonoridade para o meu salto. Mas se aqui escrevo agora, é porque me faltou coragem. E a tão ousada covardia que adiou a minha ida, trouxe de volta os meus olhos perdidos na imensidão do nada que tomava conta do meu passado recente. É pra lua que o meu hoje se entrega. Ontem ela me olhou de longe e foi se aproximando aos poucos derrubando o muro instaurado entre o céu e a terra. Tocou primeiro meus olhos, depois meu rosto como um todo. Não tive medo de me afundar nos seus poços de mistério. Apenas estive entregue. Como há muito não havia estado, eu vivi a ausência do nada por aqueles instantes. Após um ano, fui dominada por um vislumbre de vida. Sim, me deu vontade de ficar. Ficar pra viver as reticências (des)cobertas. Quando naquela curva, o carro me entregou ao chão, desejei, enquanto passava lentamente o filme preto e branco da minha curta vida, não ter partido. E te visito agora em memória para que nunca esqueças do dia em que me devolveste a vida, tirando-me dela.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

al horria

Re-significa.
Por que eu tenho escrito tão pouco?
E visto meu peito guardar todas as angústias pra si como egoísta que é.
E como egoísta que sou, não divido a minha dor com ninguém.
Ser assim arde. E arder é a maneira que eu encontrei de te manter longe de mim.
Tu e todas as tuas (re)voltas em vão.
Volúvel que fomos.
Perante o abismo, diante da leveza do voo, eu fui.
Flutuei durante quatro andares.
E a queda, que era pra ser livre, passou a ser resgate.
O mais impactante é que depois dali não tem mais nada.
O nada transparente da volúpia roubada.
Além de todos os rabiscos, rascunhos rasgados, risos e rastros,
Foi de passagem também a lucidez, o estado sensato da loucura,
o instante da calma, a distante realização da f e l i c i d a d e.
Quero cortar os meus dedos na tentativa de diminuir essa falha.
Porque tenho insistido tanto nessa falha
e deixado de ser na tentativa de tapar buracos que nem mesmo
consigo identificar onde estão...
Ouço vozes, rememoro em desespero, uma escrita que grita
para liberta-se de mim e assim libertar-se de si.
A l f o r r i a. Quando vou me livrar dessas algemas?
Sinto falta de escrever sem fugir de algo, sem a necessidade constante
de apagar as palavras que saem para demonstrar sentimentos duais.
Há algum tempo escrevi: chega, eu não vou mais sentir.
Talvez eu quisesse dizer que não seguiria mais sem ti e quando resolvi
por decretar a falência das minhas táticas de salvamento desse sentir,
O prédio já tinha sido impludido e nem pular do sétimo andar
da janela do teu quarto eu pude mais.
Eu sou o atraso.
Atraso-me pra esquecer que um dia já fui pontual e esperei em vão
por aquele que nunca me apanhou.


quarta-feira, 28 de setembro de 2011

"Escrever pode ser solidão" - disse-me nas entrelinhas de sua prosa. Eu, ciente e distante desse ato, me perguntei se escrever era uma escolha e descobri sobre a imersão no mundo dos discursos quando não há mais esperança. Talvez fosse um pouco isso. As pessoas desistem e depois elas leem. Ler pode sustentá-las por algum tempo, por uma pequena porção de tempo. Porção que é bastante desproporcional se comparada com as desistências constantes. "Então é isso, você veio até aqui pra desistir agora?" - Pensei novamente diante dos fatos. Mas precisava renová-los. E isso significava, por um pequeno instante, a não-desistência.
A grande dor daqueles que escrevem nada se compara a angústia daqueles que só leem. Um acúmulo sempre pronto para entrar em atividade de ebulição, explosão latente que nunca ocorre. E eu nunca sei o que fazer com tudo isso. Parece que tudo já passou na minha vida e eu tenho vontade de simplesmente sentar e ler uma história, mas o que é ler uma história para aqueles que guardam dentro de si os caminhos revoltos do mundo? Paro novamente para refletir sobre essa ação e sou tomada por uma imensa vontade de apagar a folha, porque vestida de branco ela tem em si também todas as dores do mundo. Dores assim não sangram. E todos aqueles lençóis brancos transformados hoje em bandeiras vermelhas traduzem a dor dos que foram além de atos como ler e escrever. A grande luta se materializa fora daqui, apesar de eu enxergá-la por vezes metalinguisticamente.

sábado, 17 de setembro de 2011

Melhor abandonada

Abandono-me aos tantos pra que no próximo retorno eu possa me dispensar mais um pouquinho.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

ou seja

preciso
dormir
um
pouco
que seja

pra
acabar
com
essa
Dor
que não me mantém
ilesa

ou seja
preciso dormir
ou
acabar com a dor
?

que seja.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Desabafo

Após voltar o coração da instituição, foi a vez do meu coração parar

Perco o caráter denunciativo dessa proposição em detrimento de uma diplomacia que nos faz calar, “pelo bem do movimento” gritam uns, quando em contrapartida, me vejo aqui escrevendo e, portanto não paro. Perdi no meio do caminho do parágrafo anterior o caráter denunciativo e mesmo assim acabei de denunciar. O que tenho visto ao meu redor não é só um baile de máscaras em que vence o que produz a melhor fantasia, seja ela com conteúdo histórico ou esteticamente mais encantadora, seja com apropriação de discursos e utopias defendidas na singularidade transparecendo a ilusão de atingir um coletivo que morreu no meio do caminho, diante do preparo das falas. Parece contraditório, mas é isso mesmo, vocês já nos perderam quando se juntaram. Alguns inconscientemente, outros defendendo interesses repudiados tantas vezes pelas próprias bocas. Mas tudo bem, “sou responsável por aquilo que digo, não pelo que entendem do que eu digo” e sendo assim, nós todos nos escondemos atrás do protecionismo paternalista: uma reverência aos paradoxos.

O revoltante é o caráter assumido por aqueles que tomam a linguagem pra si e usam dela para se apropriar das vidas, grande doença do mundo. Da mesma maneira que fizeram os colonizadores quando trouxeram toda a violência linguística, moral, física, fazem agora os donos dos discursos contemporâneos. O extremismo tomado com/por paixão tem de certo modo encarado a vida social crítica não como utopia, mas como revolução pessoal. Se hoje não temos um inimigo estável, se hoje lutamos sem saber exatamente quem estamos combatendo, resta a mim uma só proposição: da maneira como estamos seguindo, parece que seguimos contra nós mesmos.

Chamam pra luta e fecham os olhos e os ouvidos para os próprios soldados. Ainda pior, fingem ouvir, arriscam salva de palmas e depois seguem suas vidas corroborando para a invisiblidade do outro, excluem propagando o discurso da abertura e permanência. E o que mais me toca é que a linguagem me toca e diante dela não me canso.

E de tudo isso, o que restou?
O poder nas mãos dos mesmos. Mudam as caras, ficam os vícios.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

o tic e o tac

"trata-se
de me perder em mim
pra me livrar do outro"

Falou querendo explicar.
Incrível mania de se explicar.
Ela não tinha asas, mas isso não lhe impedia de voar.
O frio na barriga que lhe era constante,
passou a habitar apenas o seus sonos,
porque era lá que ela podia ver do alto.
Ver além deles.
E de todos os outros que a fizeram parar.
Ela não queria parar.
Mas como tudo que marca,
aquilo lhe veio para fazê-la quebrar o relógio a fim de parar no tempo.
Notoriamente estagnada. "
Isso não é do seu feitio" - percebia os olhares aflitos e curiosos
para entender como teria,
alguém,
conseguido lhe fazer perder a hora.




domingo, 14 de agosto de 2011

oras

já tentei me livrar do relógio
pra me desfazer do tempo,
joguei ao mar
que me trouxe de volta
todo enferrujado
um relógio
que não marca mais
as horas
insiste em me lembrar
instantes
e é exatamente
agora.

o sobe e desce da memória


Sempre antes de dormir, ouço o barulho de um balanço enferrujado que voa impulsionado pelo vento e interrompido pela chuva: brilha, reluzindo a tinta de uma memória que não falha, mas também, como haveria de falhar quando aquilo que mais marca é justamente a saudade dos dias acabados...

sábado, 6 de agosto de 2011

6 de agosto de 2011

Acordei perto das 13 horas. Perdi uma manhã de um dia que se fez com sol em todas as extremidades da casa. A chaleira chiando no fogão e eu insistindo em tirar tudo de mim para esboçar um breve diálogo ameno com o meu inconsciente que não me deixa um dia sem um sonho. Essa noite sonhei que estava lá, num lugar chamado: Natal. As pessoas procurando definir todas as coisas, resolver todos os problemas, fazer de suas vidas sentidos escritos. Adeus, céu azul. Estou seguindo essa mesma sorte, mas já nem sei se por escolha ou por razão. Dói bastante não saber por onde ir quando o caminho já parece estar trilhado. Eu só queria acordar e recolher as folhas secas da sacada. Mas tem sempre algo mais. E não é um jardim pra regar, não literalmente. Não são bocas para sustentar, nem pés pra esquentar. É algo que eu vivo tão sublime e ao mesmo tempo feroz que me come, que me mata, que me preenche. Um tipo de pressão que se faz de fora pra dentro e depois se inverte, quando você olha o calendário e precisa cumprir todos os prazos, não por conta de datas comemorativas, ou pra ter alguns dias de férias no verão. O que eu faço não tem tempo para respirar, porque estou o tempo todo pensando no que deixei de fazer, no que poderia ter feito e isso, às vezes me impede de fazer as coisas no momento em que elas devem ser feitas. É como se tivessem duas forças me puxando, uma pressiona pra cima e a outra pra baixo e eu fico na inércia do que sempre poderia ter sido, mas deixou de ser para cultuar ausências. Lembranças. A água acabou de ferver, perdoe-me a desistência, mas escrever assim não é o que me salva, aliás, escrever assim é o que me prende.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Bem, deixe-me falar da tempestade. Sim, aquele grande acontecimento no céu que parece latejar aqui dentro. E por todos esses dias cinzas onde o único som era o da chuva quando não interrompida pela chaleira, estive ausente. Ausentei-me por motivo de doença. Senti-me doente por repetidas 24 horas. Doente do corpo eu ainda posso superar, meu problema tem estado em adoentar-me da alma. E aquele som de água batendo na calçada e formando uma poça funda, levando os resquícios dos nossos últimos passos não facilita em nada a minha recuperação. Viajei por milhas e milhas e ainda respiro o mesmo ar impregnado de ontens. Os mesmos dias, nessa mesma época do ano. Agosto não foi doce para aqueles que não sabem amar. E agora me vem sendo assim, simples agosto, simples, chuvoso e frio, agosto. Lembro-me apenas do tempero que era do teu gosto e de todas as vezes que me escondi evitando acontecer os tão temidos acidentes. Covardes em agosto, setembro, causando dores e tristezas e angústias e melodias pelas metade em outubro. Resbalando num cruel novembro, desatando um difícil dezembro. Começando em janeiro ou fevereiro? Terminando em março. Abril só abriu mais e mais feridas que ainda não haviam terminado de se fechar. E maio? Solidão e desacatos. Por desamor, por insistência, por rebeldia, e novamente a tamanha covardia. Adia, adia, eu me repetia, quanto mais o fazia, mais ardia. Junho chegou trazendo tempestade silenciosa acompanhado de julho, acobertado pela descrença e ilusão. Julho passou rasgando, felicidade instantânea. Desgosto, é tempo. Quanto tempo? Dizem que passa em dois ou três anos. Fico sofrendo vendo o tempo ser roubado de mim quando nenhuma espera recompensa a falta que me faz todos aqueles dois ou três dias felizes que vivi em meados de outros tempos. Cansada de tapar buracos, inventar histórias assim como essa que veio a fim de me livrar dos traumas. Salvar agora? Salvo, mas um dia o salvo de mim.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

É no verso que eu me solto
reboliço constante
a tinta da caneta tilinta trilha
os passos que na vida
eu tenho deixado pra trás
e a mão cansada de tanto
segurar sopros dos outros
resolve falar:
- Posso soltar as tantas palavras
que correm soltas dentro de minhas
veias, mas permanecem presas
diante da tua retina?
Me acalma.
Será que tuas falas podem vir
a me servir um dia?
eu que vestida sou Maria
desnuda Sophia
apaixonada sou Laura
calada: prazer, me chama Sara.
Sou tantas, sou várias
e tantas me são
desconheço solidão
Só, que quando chega a imensidão,
quando vejo além do que meus oito
olhos nublados permitem,
torno-me pequena,
sozinha, cansada, frágil
solene,
fria.
Viro a página...
nem no verso eu me encontro.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Garota invertida.
Trocou as letras para ter controle total sobre as palavras.
E as palavras choviam feito tempestade de inverno em cima dela que não quis se proteger.
Seguia trocando.
Dia por noite.
Rua por casa.
Escrita por leitura.
Imagem por solidão.
Trocou até de lar.
Sobreviveu a tempestade de polifonias.
Acordou faminta.
Alimentou-se de lembranças.
Sorriu.
Queria desistir de trocar presença por lembranças.
Mas trocava.
E a ausência lhe tocava feito pedra de gelo.
O arrepio do vazio passou tão perto de si que a fez estremecer.
Como nas vezes que ela via abrir a janela de cortinas laranjas.
Como naquele dia.
Como nunca mais vai voltar.
Trocou a música.
Mas os dedos que sentia ainda eram os mesmos.
O cheiro e a força,
O sorriso e a maldade,
A ternura e a rispidez.
Trocou os sentidos,
Sem nada ter tido.
A soma de todas as coisas que não tiveram força suficiente pra sobreviver com ela.
O adeus e a própria sorte.

domingo, 26 de junho de 2011

Incendiária

Escrevo na madeira que é pra eu botar fogo quando terminar a construção da casa.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

"Qual é o contrário do amor?" - perguntou-se a personagem embebida pela falta da presença da outra. "O contrário do amor é a perplexidade", o estado do choque, da náusea, a falta de apetite, a dor no centro do corpo, o frio. Todas as características que ela vinha demonstrando após o trauma da partida respondiam física e emocionalmente o que nos tornamos diante do abandono. Perder-se do outro é, na maioria das vezes, logo no início, perder-se de si. Tentar entender o por que nos perdemos de nós diante da perda do outro, foi sempre um mistério para mim. Tentei, por diversas vezes, encontrar respostas para esse apagamento de identidade. Parece que sobramos a mescla do que fomos quando estávamos junto de alguém. Como pode dois corpos se tornarem um só? É uma questão que a física resolve: "dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço". Mas a ciência tem errado tanto. Isso não me basta.

domingo, 19 de junho de 2011

Indetermináveis

não há artigo no mundo que os detenha

sintaticamente incompletos

não há sentido no mundo que os contemple

sentimentalmente complexos



...


quarta-feira, 15 de junho de 2011

Deixa eu fazer parte do teu lar. Quero ver o mesmo mundo da janela do quarto ao lado. Acender a luz amarelada da tua sacada. Cozinhar com fósforos, sentir a transparência da falta de pano da tua sala. Ouvir as tuas músicas que eu sempre tive preguiça de baixar. Passar o dia inteiro no sofá entre intervalos de consciência e crises de linguagem, poesia hermética, sonho congelado, sono sucumbido, sorriso alado. Deixa eu te ajudar a esfregar o chão, tomar a água santa, separar o lixo e recolher a mesa com cadeiras de plástico. Deixa eu cultivar salsa, cebolinha, boldo e tantas outras plantas mais que trazem cura, que fazem bem. Quero ouvir a tua voz de perto, que os nossos dias não se resumam em 4 horas e algumas falas virtuais. Isso não é pra ser um casamento, é apenas um pedido comum de quem vislumbra mais do que a nossa condição presente. Quero um lugar pra gente! É pedir demais?

terça-feira, 14 de junho de 2011

Entre/vistas

eu sou um pé frio
no assoalho claro
por onde vago
intermitente
passo...

não vejo mais a mim
serena, doce
intransitavelmente
sou estopim

conto um conto
leio em desaforo
metáforas e laudos
respiro, não paro
imanente
sou, em resumo,
disparo

crio dor
sorrio em cura
placidamente
se inspiro livros, teorias
é porque já fui rua

mas volto a pé
transito a mente
se travo, distraio
se distraio entravo

sem mais
sem meias
semeia?

...

terça-feira, 31 de maio de 2011

E agora que passou, onde ancoro o meu navio?

Estranho não ter uma dor familiar pra sentir.
As pernas já não tremem, o frio é só devido aos 13º que estacionaram na ilha.
Durmo sem perigo de despertar na madrugada antes insone.
Como bem, outra vez.
A sobriedade já me satisfaz.

Onde hastear a bandeira do meu desapego?

Tudo o que leio não é mais sofrimento.
A falta de ar é por causa da alergia vigente diante das oscilações de temperatura.
Não olho mais outros dias que não os meus.

E navego em paz.
Se leio as folhas que escrevi não é mais para me amparar...
Se as leio é por arte, porque de algum momento de dor, antes, eu precisava me livrar.
E não entendo, como algo que era tão forte pode significar nada agora?

Sem trocas, simplesmente, a dor de uma perda tão esperada...
é...
nada.

Sobrou a doçura da palavra fantástica, dos textos semanticamente deflagradores,
dos sonhos recontados, da magia expressa pela linguagem antes da morte.
Doce ilusão.
Eu que pensei ter encontrado um pedaço pelo qual não saberia viver sem.
Solidão. Solitude. Só.
Sem mais nó(s).
E tampouco a melancia, amarga sacola enganosa, libertou-se dos dois pés cansados.
Restou a mim, a poesia.
Leia, agora, a l e g r i a.

Eu que pensei chorar o resto dos meus dias,
acordo, agora, semblante que brilha
"Não, não fui por aí"

Abram as cortinas, já passou da hora de eu PASSAR.

(voz taciturna: Não sinto raiva e nem mesmo arrependimento. Sinto só dó de mim [Ou talvez dor]. Dor dos dias que eu não fui. Do brilho que me abandonou. DÓ? Dó da Ré que eu dei em MIm; do degrau a menos, da cor a menos, da falta de nitidez e nota. ...Mas eu parti. Parti pra Lá! Vou nadar no oceano ao som do vento pincelando os meus ouvidos...Eu vou, eu fui.)

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Sinto falta da folga que eu sentia quando envolvida pelos seus braços. E eu não sei se isso é bom ou ruim. Só sei que falta. Como todas as tuas práticas distorcidas, as tuas palavras gastas, os teus gestos descartáveis: isso me bastava. E como me dói sonhar que um dia eu fui tão tua, na rua, na lua, crua e nua. Acordar sem ti também é uma forma de recordar que hoje eu sou só tensão. Será que foi só ilusão? E leio Caio na tentativa de passar: "E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços." Na segunda sobrevivida queria saber do teu fim de semana, do teu começo, de quem dorme no espaço dos nossos dias, quem fala e sorri na lacuna das nossas vozes, quem veste água que cai do teu chuveiro frio nessa ausência de valores. Se tu também a abraça quando sente teu peito gelado de madrugada, se durante o sono também clamas pelo nome dela como gritavas pelo meu, se no gaguejar dos teus pedidos também choras por ela quando sentes que já não estão mais ali. Eu só queria saber quem tem ocupado o teu coração nos dias em que a minha cabeça se ocupa pra não te querer ainda mais quando o sol chega. Queria saber se também tens lutado para me esquecer diante da noite que traz de volta os nossos cheiros. Eles nem são mais nossos, e o vento já levou.
Eu achei que eu era feliz. E hoje, posso ver, eu vivia um estado de encantamento pela vida. Alguns dizem que agora eu vivo num mundo encantado. Só quem já conheceu a felicidade pra entender muito bem o que é o inferno. Revendo, eu apenas vivia a ilusão. As vezes, penso, será que se eu fosse alienada eu seria mais feliz? Prefiro dor a ser enganada. Essa é a minha resposta. Não existe felicidade...
trata-se apenas de poucos e pequenos, não raros, momentos. O tempo tem me apagado.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Respira fundo e descobre...

http://www.youtube.com/watch?v=VrFtqWfhSO0&NR=1&feature=fvwp

"o que será que será que dá dentro da gente que não devia?!"



Tem um desespero velado por um sistema medíocre que continua enganando. Enganado está quem continua achando que temos voz, direito, que vivemos uma democracia. A democracia que vivemos hoje é a do consumo. Seu único direito e o de consumir cada vez mais, derrubam sua moradia, exploram o seu trabalho, sobrevoam sua cabeça destruindo civilizações inteiras. Apartam a sua voz, deixam-te morrer de fome, e dilacerado estás porque roubaram a sua saúde.Agora, estão de olho na sua sanidade. O louco não interessa para uma sociedade hipócrita, porque da mesma forma que ele extrapola a permissão, ele emite sinceridades que dilaceram a acomodação daqueles que choram a sua frente e quando viram as costas dão risadas fechando acordos com o regime mais ditatorial do mundo, o capitalismo selvagem. Nesse mundo, roubaram a sua identidade e a única coisa que fazemos é reproduzir os discursos dominantes, conteúdos descontextualizados, práticas de recrutamento. Roubaram a nossa melhor alma, arrancaram o nosso coração e desmotivados todos estamos porque é interessante que matemos os nossos pares. Você que senta diante da televisão e encontra entretenimento as cegas, você que anda de ônibus pagando por um direito que é livre teoricamente, o de ir e vir, o direito de pertencimento a um lugar, uma cidade, uma raiz. Olhe ao seu redor, você que ainda tem motivos pra sorrir, desfaça esse riso do engano e passe a refletir sobre a catástrofe que vivemos. Não é passado. Todos nós estamos matando ao outro quando erramos por omissão. Levanta. Esse canto que eu sei está dentro de ti ainda pode renascer e nós sempre podemos. Empoderamento e protagonismo social, acorda e comece a fazer valer o seus direitos. Comece hoje a viver você.



Att,

Eu.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

meus olhos, querido amigo, estão nublados
nublados de tanto chover.
meus dias, meu caro amor, estão cansados
cansados de tanto esperar.
meu pranto fragmentado, meu peito cortado
sorriso quebrado e de tudo, permaneço afastado

a monopolização da sabedoria
quantas almas mais vamos sugar por ideologias compradas
há quantos anos estamos da desalienação
não sei...

mas a mim, restam 48 horas, e o tempo
nunca mais passou a meu favor
estou te desvivendo a cada dia
e tu me esquecendo sem saber que talvez poderíamos
há mar
onde não estouram ondas
sentimento incapaz
meus sonhos já não cantam mais
e o palpitar dilacerado afasta nossos dias não realizados
leve tua mão suavemente ao coração
e minta
nem todas as tuas ideias estão rendidas ao mundo
venha me ver com outros olhos
com outros olhos

olhos tão nublados.
no entanto, pretensão a luz
sou eu que chovo, e tu que tens os olhos marejados de ameaças tempestuosas
esfrega teus olhos, aparta tua dor.

põe teu caos no lugar do meu cais.

terça-feira, 19 de abril de 2011

"Meu blog não é um diário. Aqui escrevo e ponto. Escrevo porque preciso. Melhor, vivo porque
escrevo."

Camila sendo linda no filme: Nome Próprio.

"Não gostou, não lê. Simples assim".

terça-feira, 12 de abril de 2011

"Mas..." - ela parou para ouvir aquelas palavras, por incrível que pareça, dessa vez em silêncio -"...Você já parece perdida de você faz algum tempo, não é?"

Tinha sido pega de surpresa. Por poucas vezes isso acontecia e quando acontecia, ela nunca queria admitir sua fraqueza perceptível. Tinha lido essa semana um fragmento que a fez doer um pouco, a fez lembrar muito, a fez fechar os olhos e repensar mais uma vez nessa tal imagem de estar tão perdida dentro de si mesma, ou para fora do que estava ao seu alcance. Só podia ir até onde acabava seu limite e seu limite - dessa vez - era o outro, a vontade do outro de não estar ali.

E leu novamente, antes de responder impulsivamente a pergunta curiosa acima: "Este documento é para que em qualquer lugar que esteja, antes de sair, nunca plante uma constelação nos olhos de quem nunca viu a luz". E doeu de novo, como todas as vezes que ela voltava naquela mesma página para ler a mesma frase destacada em meio ao "documento de saída". "Antes de sair" - pensou ela, "Antes de sair" repetiu. Revozeava enaltecida pelas palavras que latejavam sua consciência. Reviveu...

Era noite. Quase madrugada pode se dizer.
(como dói relembrar, mas era preciso se livrar de mais essa memória, de mais essa promessa não cumprida)
De roupa limpa, cabelos que cheiravam a noite nem tão quente, nem tão fria de um quase verão submerso de partidas. Seus pés vestiam nada mais que as calçadas e pronta para ir em frente (pela 3ª ou 4ª vez naquele ano) ela disse estar preparada para dançar: Sozinha. O pior não foi dizer estar pronta, mas acreditar que estava. Ela acreditava desgraçadamente que podia continuar, ver e não estremecer, chegar perto e não latejar o peito. E só ela podia ter a certeza de que estava pronta, por mais que todos desejassem que ela estivesse. Como aquele que se aproximou no meio de todos e disse: "Que vontade de te beijar agora, mas eu não posso fazer isso". Ela o encarou e saiu sorridente, ciente de que sua segurança estava de volta e bem presa entre suas mãos pequenas.

Desfilou com olhos brilhantes. Dançou, correu, participou de abraços que talvez só fosse sentir daqui a uns meses outra vez. Voltou a crer. E o mundo inteiro aplaudiu a sua volta, pelo menos antes daquele amanhecer.

Eles se olharam. Entreolharam. Estava tão cansada desse plural existir só no papel que desejou ter uma borracha para apagar tudo aquilo, porém também estava decidida a não olhar pra trás e por isso, esqueceu. Só que para ele não era tão simples assim. Premeditado. Se drogou consciente de que aquilo o impulsionaria. Não era covarde, era apenas imaturo. Segurou-a pelas mãos o mais forte que pôde e os dois partiram dali.

Mas para onde? Muito bem, agora eu lhe pergunto: para onde você vai levá-la? Para de novo enfraquecê-la. Eles não tinham para onde ir porque nunca eram dois, nunca foram. E ele pede pra que ela fique e ela cede talvez desejando mais do que pudesse acontecer, novamente idealizando, protagonizando a mocinha que é enganada, mas não se vinga porque no fim nunca deixa de acreditar. Ou porque não acredita é em vinganças. Ou ainda, porque apesar de tudo ela lhe quer tão bem...

E chega a hora do "documento de saída". O chão é o que resta para eles e é lá que eles fazem o seu lar, rodeado de planos e promessas que não passariam daquela noite, ou que só chegariam até o amanhecer, ainda emocionados.

"Namora comigo? Vamos namorar?" - Não era verdade, ela não podia estar ouvindo isso depois de 3? 4? 5 meses de idas e voltas nunca prontas.
Deitados no chão, olhando pro céu...ouviu-se a voz baixinha cheia de receio dela: "Sim." E lá foram eles, deram as mãos e não olharam pra trás. No caminho, mais uma vez ela o ouviu recitar o futuro dos dois: "Eu vejo a gente junto pra sempre, você não tem medo disso? Eu vejo a gente junto..." Ela não respondeu com palavras, talvez nem conseguisse falar. Segurou a mão dele o mais forte que pôde e caminharam pra onde talvez fosse o único lugar que abrigou suas histórias (e que hoje nem existe mais).

Naquele momento, as roupas pareciam ser uma burocracia tamanha. Amanheceram vestidos um pelo outro. Só que não foram feitos um para o outro e por isso, quando ela o viu abrir os olhos já imaginou quais seriam as suas palavras.

Saiu de lá sem forças e agora, meu grande amigo, eu posso muito bem te responder:
foi depois de tudo isso que eu me perdi.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Os ventos do inverno trouxeram consigo a vontade de seguir, não sei em que direção, mas acredito que os fantasmas do verão possam ser exorcizados diante do frio que chega calmamente, pedindo contágio, sorrindo das formas (ultra)passadas.
Ouço a pergunta: "Para onde você vai..."
Penso em silêncio...se der sorte, em frente. Imitando um personagem de desenho, sigo tentando encontrar as inúmeras pessoas que me habitam.

domingo, 3 de abril de 2011

On-tem...

Eu senti tua falta e quis gritar teu nome.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Dihálogo?

Onde está a minha voz
em ambientes fechados,
hierarquizados, enraizados?
silêncio....

Onde está o meu querer
quando sinto medo,
quando olhares me oprimem
silêncio...estabilizado, instaurado,
onde está o meu diálogo?

Qual o seu acúmulo?
a sua (in)formação,
de onde você vem?
pra onde você foi?

Lógica que se inverte,
[quando fechamos as portas.]
Nem ouço mais.
olho, finjo...
nem [vejo] mais.
sorrio, discorro...
nem c o r r o mais.

Onde está a palavra,
sentenciada.
Quanta polidez
pra promover a sua ordem.
Quanto velamento
pra disfarçar
a crise.

Quando foi que se perdeu,
o direito,
a liberdade,
se é que um dia
(um belo dia)
nós tivemos,
ou são eles que nos têm?

Do que você faz uso,
crença, fé?
Pare.
Perdi meu pé
Pense.
Perdi meu chão
Sinta.
situ(Ação)
Isso aqui ficou só no
papel.
E o seu discurso é nada mais que
reação.

Onde a luta fala?
não aqui.
Seus castelos de cristais
estão prestes a cair.
Onde a luta cala?
Você é fragmentação.

E eu?
Já não creio mais.
Não aqui.
Não por ti.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Essa é a versão editada daquela carta que te escrevi e rasguei. É uma carta de despedida. Porque diante de tantas luas sem o som das nossas vozes transpassadas, não vejo porque seguir na tua espera. Eu digo em alto e bom tom: vai pela sombra. Leva contigo os nossos dias de brisa, aconchego, sonos perdidos, coleção de sorrisos, olhos molhados. Leva também a tua mala que terminei de arrumar logo após você me deixar com olhar de volta. Atrás do armário, deixei teus dois sapatos novos, vista-os e se retire sem pestanejar.

Eu não esqueço que fui eu quem pediu pra você ir. Mas também nunca encontrei motivos pra te pedir pra ficar. E você tampouco em mim. Fomos covardes porque não acreditamos que poderíamos durar na corrida dos nossos dias por liberdade. Covardes porém jovens. Fomos jovens demais, impulsivos demais, orgulhosos demais. Nosso tempo passou.

Não acredito que você irá encontrar pelas ruas, mãos como as minhas, nem olhos travessos, nem sonhos ilesos...como também são os meus.

De presente, deixo-te a partida. E parto também. Em direção oposta. Por fim. Por um fim. Pelo nosso fim. Não estou mais aqui.

quarta-feira, 23 de março de 2011

teus olhos vestidos de tentação são mera fantasia vampiresca
ah, quanta maldade
teus lábios calados, distantes do beijo
desenham saudade

teu corpo sonoro velado de medo
sorri para dentro
afasta o premeditado
corrói o derradeiro
tuas mãos, quantas curas trazem
e depois envenenam meu cais

seja para mim essa noite
causa, revelação, memória
seja um minuto que seja
mas não vá embora tão cedo

não nos deixe desamparados
cometa latrocidades
te engana
vem cheio de dó
que te toco em mi
nota suave composta por tristeza
proeza, leveza,
faz desse tão longe
um atalho para a nossa ritmia

apalpa meu coração com teu amanhecer partido
mas chega, chega de me partir
hoje eu só sou,
sou só
reduzida a pó, destruição, sujeira e sal
meus pés não dançam mais
e a trilha deixou de ser aventura
para ser nada

tão gelada, mulher de lata
e já não choro mais
porque até as minhas lágrimas se foram contigo
por ti
me olha novamente e faz adormecer
essa frieza constante

vem!
já é tão tarde sem ti

domingo, 13 de março de 2011

Eu me protejo no indecifrável. Alguns podem achar que é covardia. Mas, pela primeira vez em muito tempo, eu venho aqui pra falar de mim. E marco sim, a primeira pessoa muito claramente quando muitos escolhem se esconder. Só que novamente necessito me lembrar, eu estou aqui pra falar de mim. Dessa minha euforia com o início de uma nova fase que promete novos começos e muitas histórias. Pelo menos algo que não me deixou, que ainda insiste em me tomar para si. Um lugar em que eu creio, um lugar eu que eu posso ser. Já faz tanto tempo...

Permaneço olhos e coração fechados. Batidas e piscares que palpitam , pelo incomum, pelo mistério, numa luta interminável em busca da descoberta.
Pelo som que não pára, o beijo incontido, o sonho não realizado...
As mãos que tremem enquanto se distanciam, os corpos que dançam motivados pela caricatura do (i)realizável, as sombras que desaparecem em cada nascer de sol.
Eu quero a maldita vontade de sair sem rumo. O palpitar da insegurança. O náufrago dos desalmados. Os palpites dos desavisados. A miséria dos abençoados.

Vontade de que permaneça. De que não haja cura pra toda essa ausência,
Combustível insolente e responsável pela minha vontade de não desistir.

Já faz tanto tempo...e eu ainda estou aqui.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Eu só sei que sinto. E sinto tanto. Que sinto muito. Dessa vez é pra valer: eu não vou mais sentir. Saio na rua com o coração aflito. Cada pessoa que olho, cada verdade que escondo, cada sorriso maquiado é porque já não sinto. E peço que venhas e me traga a verdade, mas sei que a verdade carrego em meu peito debruçada sobre a solidão da minha alma. E cada dia mais que ando na companhia dos meus eus multiplicados em cada partida, mais eu crio episódios de fuga. Idealizo aventuras, tomo de volta o que a vida me tirou, mas tudo isso na cabeça inconsequente, tudo isso no papel borrado pela violência das lágrimas que dispenso cada vez que lembro. Beirando a loucura dessa minha vida fragmentada quase sou capaz de acreditar nas vidas que crio em meu interior latente. Latejo, com as mãos trêmulas, os pés descalços, esfolados de tanto correr dessa dor, ouço uma voz que me chama em desatino. Deixo que ela fale. Ela entra, me encara e observa as minhas fraquezas todas expostas, feridas que nem cicatrizam e novamente são botadas a prova, pele que nunca sara. Espero que fale. A voz continua a me olhar. Começo a duvidar da veracidade dos fatos. Grito novamente comigo, eu grito. Diante da ausência das perguntas que não fiz, crio respostas que nunca saberei. E a voz torna a me lembrar o que é viver de angústias, de falas idealizadas, de momentos ultrapassados por aquilo que não é dito, por tudo que não é tido. Até que a ouço, não sei se por alucinação, não sei se por desejo, mas a ouço:
- Filha - a voz é forte - Trouxe a ti um recado de teu filho. Este que chora dentro de ti porque ao mundo não pode habitar devido a incapacidade de seus pais.
Respondo com um silêncio covarde. E a encorajo a seguir ditando, quem sabe, um pedaço de verdade.
- Filha, teu filho chora. Afasta de ti essa amargura e traz teu pedaço pra fora. Peço que te envolvas, peço que te aceites e liberte teu ventre. Não te angusties, filha segue.
Fecho os olhos e respiro fundo. Eu quero sentir novamente. Não parto. Não há este parto. Será que era você a verdade dos meus dias? A mim deves um filho. Aquele que matamos todas as vezes que fomos covardes. Agora, ele vive aqui dentro. Juntos vamos lutando pra vencer a tua ausência. Onde estiver saiba que és pai. Teu sangue cresce dentro de mim a cada dia e eu o alimento na esperança de que ainda tenha algo de ti dentro de mim. Carrego em meu pranto, a dor da esperança de que tenhamos um parto saudável e enfim eu possa me livrar disso que nutro, esse sentimento que sobrevive de meu corpo, suga a minha alma, evoca meu espírito.

Novamente um quarto vazio. Uma janela entreaberta. Um som de silêncio. Chega.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

(...)
Tom: Qualquer um pode fazer um grande gesto romântico, certo? A grande questão é: o que acontece depois? Você se lembra? Você se lembra o que me disse nessa noite?
Laura: Sim, eu me lembro de tudo.
Tom: Então, o que você me disse?
Laura: Disse que era a noite perfeita.
Tom: Disse que era a noite perfeita.
Laura: Então?
Tom: Então? Como eu supero isso?
Laura: Nos divertimos tanto.
Tom: Nos divertimos muito.
Laura: Então, qual é o problema com isso?
Tom: O problema é que toda vez que tínhamos uma noite dessas incríveis, eu acordava na manhã seguinte em pânico. Então porque não poupamos um ao outro de uma vida mundana de desapontamento esmagador, e apenas fazemos isso com outra pessoa.
Laura: Essa é a desculpa mais fraca que eu já ouvi. Só diga que está amando a Lila.
Tom: Dizer o que? Quer que eu diga que quero me casar com você? Que passarei os próximos 50 anos lamentando este exato momento?
Laura: Você me inspirou.
Tom: Você me inspirou também.
Laura: Então nós deveríamos ter ficado juntos.
Tom: Eu sei.
Laura: Eu vou e vou dizer a todos que você está bem.
Tom: Mas eu não estou. Não estou bem.
Laura: Foi você que escolheu isto.



The Romantics, filme, setembro de 2010: Cena inspiradora e título instigante que combina com a peça, onde os que a ensaiam escreveram - Os Românticos Incorrigíveis: equívocos de um movimento.


segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Eu grito para quebrar esse teu silêncio tão egoísta.
E só. Nem vento, nem pó.
E ainda não vivo.
Tenho sobrevivido a tua falta.
"Percebo agora que o teu sorriso vem diferente…quase parecendo te ferir".
Ah, meu querido, que falta me faz teu bem querer.
Dispensas a previsão, mas te prevines de mim.
Você acha que eu não quis insistir em nosso caminho?

Dizem que ele só existe quando a gente passa.
Porque "isso de não saber o que somos ou será que somos.
De ter que definir pra assim eu poder acalmar e te sentir, me mata."
Aliás, como canta a música "me matava".

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Porque enquanto não encontro meu caminho, não consigo te trazer para perto de mim. E não finja acreditar nessa conversa de que quando duas pessoas se gostam ficar junto resolve tudo, dissolve as dúvidas, ampara os sentidos, aponta as estradas, constrói o porto... Ficar junto não resolve o amor. Amor não se entende e quantas vezes morri no porto tentando lhe mostrar que isso se vive, sem amarras, nem planos Sem almoço aos sábados e futebol separados aos domingos. E nós merecemos mais do que essa comodidade superficial.

Porque estivemos perto demais. Dormimos embebidos pela ilusão do nosso aconchego e por um tempo acreditamos que isso nos bastava. Não que eu me arrependa de ter acreditado, mas também crescemos rápido demais. Nos tocamos fundo de verdade e o toque foi a mais alta fonte de magia para as nossas rebeldias.

Eu grito para quebrar esse teu silêncio tão egoísta. A única coisa que perdemos foram nossas roupas carregadas demais de contágio pelo suor calado de dois corpos cansados. E só. Nem vento, nem pó. Chega mais perto, amor. Porque com você eu quis mais do que ficar, com você eu vi meus olhos fechados caminhando guiados por tuas mãos frias.

E por isso eu te larguei. Não aguentaria viver mais um dia longe de ti. E ainda não vivo. Tenho sobrevivido a tua falta. Você consegue sentir? No entanto, "percebo agora que o teu sorriso vem diferente…quase parecendo te ferir".

Ah, meu querido, que falta me faz teu bem querer. Você acha que eu não quis insistir em nosso caminho? Dizem que ele só existe quando a gente passa...

Simplesmente porque "isso de não saber o que somos ou será que somos. De ter que definir pra assim eu poder acalmar e te sentir, me mata". Aliás, me matava.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

"The street heats the urgency of now as you can see there's no one around"
Smashing Pumpkins

"Mais rápido do que pensávamos que iríamos cobertos pelo som da esperança" de uma tarde que tinha de tudo para acabar como os últimos meses. Nem terminei de sofrer e já me deparei com outro motivo. E foi tudo tão rápido e foi tudo tão constituído por flashes repentinos de uma noite esperada, mas nunca prevista.

Naquele momento ninguém podia acreditar que guardanapos podiam unir mundos. Dois mundos tão distantes e ao mesmo tempo cheios de equivalências, de poemas traçados, livros ousados e carinhos ultrapassados. Mundos submersos por uma coleção de papeis, de um lado guardados, colecionados, de outro inventados.

E porque escrevo, inventei de escrever para ti. E trazer teus anseios pra esse mundo sonhado, com cheiro de grama verdinha regada por orvalho, cenário de festas enaltecidas pelo vigor de viver o agora. De azul anil, só o fundo do lago imaginado, de escuro, só enquanto a velocidade zelava pela nossa insegurança em estradas desconhecidas dos seus olhos.

Dos beijos roubados, dois cabelos compridos uniram as bocas porque um tinha medo e o outro queria sumir sem rodeios. Rodeados pelos bastidores da vida, nenhuma multidão os intimidou...nem a eles, nem a elas. Somos compostos pela ânsia do desejo que não tem perigo de acabar. E nenhuma definição estaria a altura de nosso tempo. Esse que salva, que acolhe, que traz os braços no mesmo momento que os leva embora. Ninguém ocupa o lugar do outro que se foi, eu tento me lembrar enquanto vestida de água gelada. Mas acolhe.

Enquanto balançamos na rede, duas lágrimas escorrem sem saber que duas mãos a esperam cair para então secá-las. E assim, elas se vão. E assim, nós vamos. Lutando para entender mais sentimentos sem chão, mais idas sem voltas, corações vazios, detalhes sem linha do tempo.

A vontade de ficar é o aviso de que devo ir. Sem ar, faço força para respirar e me pergunto quando acordo, será que algo vai durar? Qual é o limite do tempo? Quantos batimentos eu aguento antes do meu coração parar por falta? Quantos dias a mais sem chão, no caos, sem som, no limbo?

Dessa vez eu não acordarei sozinha. Abraço tuas mãos e peço: "posso dormir contigo?". Depois de tantas mentiras que eu sabia, já estavam por vir, tanta dor, que eu já tinha sentido antes, tanto amor desgatado, tantas revoltas ensaiadas, ossos quebrados, eu só queria uma noite de paz para sentir que o mundo não é tão ruim assim e que alguém pode não hesitar em estar lá por mim.

Quando tintas de canetas desgastadas por pedidos inacabados unem os mundos opostos de marte e vênus. Quando marte ataca e vênus se rende. Quando vênus pede e marte cede. Quando marte abraça, acolhe, mostra o espelho para vênus que já nem se reconhece mais. Quando vênus acorda com vontade de seguir depois de parar tanto tempo esperando por um tempo que nunca veio.
___________________________________________________________________________________

ps¹: tudo isso é devido a falta de uma definição naquele lugar de definições inacabadas que você me mostrou.
ps²: obrigada por me querer num pedaço de tempo que seja, você me mostrou, acima de tudo, que eu ainda posso sorrir.

Resposta assimétrica ao texto: "Por que elas só dão para idiotas", de Gabito Nunes.

Gabito escreveu em uma de suas crônicas que "toda garotinha quebrada" só deixa "se embalar pelo ritmo quente daquele que menos inspira confiança", ou seja, "quanto menor o pulo, menor a queda" e conclui racionalmente: "Então elas têm a magistral ideia de só dar para idiotas. Sem perigo de emoção. Sem ameaças de promessas dissonantes. Sem aborto de sonhos. Sexo seguro".

Tá certo, Gabito. Você fala em defesa dos homens legais que você não denomina assim, mas podemos entender como os "bonzinhos" das histórias pós-modernas de amor. E porque eu falo em nome das mulheres desse tempo que preciso discordar de ti.

Primeiro: não é porque estamos machucadas que ficamos com "idiotas", aliás quem são os idiotas da história, os que nos dão sexo por mero e absoluto prazer ou os que nos prometem mundos e fundos quando queremos apenas acordar submersas por lembranças que não nos impeçam de seguir atrasadas porque outros desejam ensaiar amor quando o amor não precisa de ensaios. Ele apenas está por todas as ruas, solto, livre, sem essa pressão social toda que teima em institucionalizá-lo e por esse motivo - e somente por esse motivo - frustra tantos mocinhos e moçoilas antes mesmo de acontecer.

Segundo: não estou aqui para defender os "idiotas" que mentem por prazer como nós, nem para travar a guerra dos sexos no século em que a luta pela diversidade tem ganhado as ruas com seu amor revolucionário - e libertário - que não fala por homens ou mulheres, mas em defesa dos homens, das mulheres, dos velhos, das crianças...fala por todos, sem discriminação.

Eu tenho uma veia fulminante de cunho revolucionário que luta para sobreviver em mim diante do contato com outros sangues onde imperam, reinam - no sentido monárquico do termo - glóbulos moralistas. É em defesa da luta que eu falo. Dessa luta que acontece em virtude da liberdade e se concretiza no limite da expressão por impressão.

Não optamos por um ou outro tipo de cara. Só não gostaríamos de fazer com eles o que não nos apetece que façam conosco. Não é por medo é em oposição ao medo. É para levantar a bandeira da coragem de assumir o desapego numa época em que coroam heróis, os que sobrevivem ao casamento quando deveríamos era vivê-lo e não torcer para que ele não morra pelo desgaste que o tempo provoca.

A meu ver e a seu também, o amor está fora de moda. Mas aquele amor abstrato, ideal, ultrapassado, romântico. Hoje o amor é outra coisa. Bem indefinido, vestido de dor, mantido por lágrimas. No século vinte e um, amor é tudo aquilo que se sente sozinho (caí na contradição de defini-lo, mas isso é uma teoria simplista do que pode ser tomado como amor). Preocupados em entender nossas relações criamos esteriótipos para sanar nossas incompreensões. Nos perdemos ainda mais no labirinto sem fim da busca humana. Porque o amor institucionalizado é como uma roupa que a gente veste.

Quero é ver quem tem a coragem de ficar nu para assumir todos esses machucados que deveriam nos impulsionar a desconstruir essa fórmula pré-construída de amar. O machucado não nos faz parar em qualquer solução repentina e segura. Ao menos a nós, mulheres pós-modernas. Ele é só mais um motivo para não estagnarmos. E é somente por isso que nós tiramos as nossas roupas.


O texto de Gabito Nunes, motivo desse post, foi publicado no livro "A manhã seguinte sempre chega", do mesmo autor, pela editora Leitura, edição de 2010: Belo Horizonte.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Ela tinha um guri para si. Um guri que não tinha fome e nem conseguia ler como ela. Ela tinha uma vontade de acolhê-lo em seus braços quando ele aparecia sem chão, no meio de qualquer noite imersa de madrugada fria, cinza, ou branca de lua cheia. Ela queria cuidar sem perceber que precisava também de cuidados. Acreditava na intensidade com que ele a segurava quando a queria em meio ao álcool, diante de sons confusos daqueles que não precisam falar o que querem porque apostam na linguagem dos corpos. Ela dormia. Por algum tempo ela dormiu e sonhou. E porque sonhou teve que despertar. Sem o seu guri, já não se reconhecia mais. Adotou outros na esperança de sanar a dor da ausência, mas logo eles também se foram. Não bastava. Nenhum deles era bravo como ele quando ela o contrariava. Nenhum deles pintava a raiva da contradição no coração dela como ele fazia. Um deles sabia desaparecer como ele, mas ainda assim não tinha a audácia no rosto, a mentira nos lábios, as mesmas mãos carregadas de impulsividade como as daquele guri. Agora ela entendia um pouco do que era aquele sentimento conturbado. Nada de paz, segurança, afetividade, nem um pouco de reciprocidade para o bem. Era tudo que circunda o caos, que destrói a auto-suficiência, que fere a afeição. Era tudo o que se sente sozinha. Debaixo de tantos sóis, distante das gotas de chuva de um inverno a dois. Nem isso, nem nada parecia mudar o fato dela ter tido aquele guri para si. Talvez ela nem o tivesse tido, e tenha sido sim, somente carência. Mas, o guri a teve. A teve para si em corpo, alma e coração – como num último romance à moda antiga – porque ela sim, doou-se a ele. Não por se iludir ou ainda, acreditar que seria diferente ao seu lado, mas por irreverência e coragem de viver o que sentia. Por saudade de gostar de si ao lado de outra pessoa. Pra se lembrar de andar com olhar baixo, sentir frio na barriga e corar diante das besteiras a dois. Por vontade de abraçar no escuro, de ter um lugar pra correr na chuva, por ser intensa talvez por uma última vez. Até que um próximo guri chegue, ou não. Ela só precisava dizer que teve um guri pra sentir que até então não houvera morrido a vontade de dividir-se com alguém. E mesmo que hoje ela sinta raiva desse mesmo gurizinho, inconstante, dissimulado, apaixonado, ela pensa nele quando vai dormir. E isso a faz se questionar. E entender que os sentimentos não permanecem segundo a bondade que os envolve, infinitam-se paradoxalmente por aquilo que dói. Quanto mais doer, mais vai ficar. E essa foi a primeira idéia de liberdade que se diluiu em sua vida. Ela achava que quanto mais tristeza a invadisse diante da inconstância dos atos dele, mais seria fácil dela o superar. E assim, ele também se decepcionou, pois igualmente havia dito e feito tudo para que se machucassem, no entanto, não pôde livrar-se do que sentia. Por isso, ela ainda achava que estava ganhando. Enquanto o seu guri planejava a vida sem pensar no agora, ela pensava no agora e os planos iam se desenhando involuntariamente, conseqüências de tantas voltas. Pra quem vive o agora – pensou ela baixinho enquanto sacudia o lençol submerso do cheiro dos dois – o sempre não faz questão de existir. Queria dizer adeus, mas para isso, precisava acreditar no “sempre”. Ela tinha um guri para si, por agora, ela o tinha.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Me apaixonei pelo Lobo Mau em pele de cordeiro.
Aquele que faz as perguntas que não quero responder,
E traz consigo as respostas que finjo não ouvir,
Os olhos que não insisto ver,
A boca que não desejo beijar.
Me apaixonei pelo Lobo Mau.
E ele nem quer mais me comer.
Lobo, deixa eu ser mais uma vez a sua Chapeuzinho?
Lobo, eu trouxe a cesta que a vovó mandou.
Dentro dela não tem doces.
Só um pouco da minha dor, e muito do meu amor...
E ainda mais do que sobrou...

Era para eu matá-lo e ir embora.
Era para eu ser a vilã dessa história.
Mas ele foi embora e me matou!

E agora, João?
"Sob nós o silêncio
o mudo caminho
de ir-se

vou
arrancaram-me os motivos
para não ir
a partida é necessária

deixo as bagagens
meu peito não suportaria
o peso de tantas malas

sob nós cobrirão os rostos
os nomes
seremos sempre estes
estes que se amedrontam

ao dar o primeiro passo"

Ryana Gabech - sobre precipícios, muros, passos que não deveriam ser em falso. sobre todas as coisas que doem quando não há pés que ultrapassem as pedras somando entregas angustiadas à palavras negadas.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Clarah acreditava no toque e escreveu que não concebe a vida sem contágios; que ninguém vive o amor impunemente; encontrou-se frente a frente na dor da solidão de uma sala vazia. Uma sala vazia de corpos, mas repleta de almas. Não, ela não falou com Deus - ou deus. Não ouviu vozes do além, nem sentiu toques no escuro. Eram vozes na cabeça, arrepios dentro do peito, diálogos consigo. Era a Clarah e somente ela.

Corri um pouco mais do que minhas pernas eram capazes de suportar. Não tinha lado, não tinha mãos. Foi então que me vi mais próxima daquela que ofusquei por causa das consequências dos meses anteriores. Era ela. Um feixe de luz passou sob meus olhos que apertei na tentativa de segurá-la. Gritei. Senti. Não, não vá. Só por essa noite, fica. Posso dormir contigo hoje, segura? Consciente de que amanhã vou acordar sozinha, eu só tinha vontade de me contaminar pelo hoje, pela força que o agora ainda provoca no meu corpo tão doído de passado, tão cortado por lembranças.

Passou. E fingiu não ver.
O que estava ali, não era apenas eu. Sobre a calçada, o minuto se foi. Mas você fingiu, fingiu novamente não saber o quanto eu desejo você.

O amor que foi embora. A dor que fica agora.
A paixão permanece igual. E você fingiu não notar, que quando eu passo os meus olhos não podem mentir: queria ter você aqui.

Com força segurei meus olhos na esperança de não perdê-los outra vez no seu corpo impulsionado pela ida. Queria, menina, ser aquela que você nunca deixa, apesar de eu saber que pra mim você sempre volta. Dessa vez o sempre tem demorado demais.

Até quando?

She's gone but...Ela vai voltar, ela vai voltar.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

“Não encontrareis aqui uma galeria de retratos; trata-se, pelo contrário, de armadilhas, armas, gritos, gestos, atitudes, astúcias, intrigas, cujo instrumento foram as palavras. Vidas reais foram ‘postas em jogo’ (jouéess) nessas frases; não quero dizer que ali foram figuradas ou representadas, mas que de fato, a sua liberdade, a sua desventura, muitas vezes também a sua morte e, em todo caso, seu destino foram, ali, pelo menos em parte, decididos. Esses discursos realmente atravessaram vidas; essas existências foram efetivamente riscadas e perdidas nessas palavras.”

Michel Foucault: de ti eu leio enigmas que me impulsionam a descobrir os mistérios dessa nossa tão atordoada, inconsequente e sufocante vida.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Novamente me vejo lutar em direção oposta. Todos vocês dizendo o que eu tenho que ser, o que eu tenho que fazer e mais uma vez eu ouvindo vocês, pacientemente, torcendo pra que outra vez esse amor involuntário que eu sinto por poucas pessoas que me cercam, seja capaz de não sucumbir e entender que eles só querem o meu bem. Agora eu me pergunto: E se eu quiser o mal?

Partir sem lugar. Correr sem certeza de uma chegada. Enlouquecer a ponto de não ter camisas de forças para me conter. Porque é assim que eu tenho me sentido a cada palavra de cuidado que vocês me jogam e eu recebo como se fossem canivetes a cortar todo o meu corpo. Mais uma certeza de desconfiança.

Eu sei que vocês zelam por mim. Enquanto eu durmo, no nosso sossego. Enquanto eu corro, sem desviarem os olhos. Enquanto eu parto, enviando mensagens de qualquer forma. Só que talvez o que eu tenho precisado é viver sem seus olhos curiosos, atentos, zelosos, pretendendo me puxar de cada buraco que eu entro. Alice não precisou de mãos para socorrê-la. Maria viu seu filho morrer sem ninguém ao lado dela pra dividir a certeza de que ele era inocente. Elis escolheu outra vida e todos tiveram que aceitar. Talvez não confiem em mim o suficiente; Nessa minha vontade inconsequente de não voltar mais; de cair sem rumo; de chorar por alguém que se foi até as lágrimas secarem; de mergulhar as dores em busca de uma paz que só se tem quando se nega esse mundo.

Não estou aqui para justificar a minha necessidade em me livrar de tanta atenção. Só cansei dessa luz com potência de mil holofotes em mim. Se grito é porque me sufocam; se choro, é porque me espremem; se canto, é porque necessito fugir. Se escrevo é porque não encontro forças pra falar dessa dor que me corrói ao saber que dói mais em vocês não conseguirem me fazer parar. Ouçam essa minha voz sufocada pelo nó na garganta. Leiam essas minhas palavras enroscadas em entrelinhas. Eu não quero parar. Se o amor de vocês for tão forte - e eu sei o quanto ele é - vocês entenderam; me deixem livre porque o meu maior orgulho é saber que a liberdade ainda pode me habitar, por mais que meus olhos fechem por alguém e meus pés insistam em dançar por tijolos que não reconheço mais.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Meu coração parou. Por alguns segundos eu desejei não estar onde eu estava, não ver o que meus olhos estavam sendo cúmplices, não sentir as minhas mãos suarem; e, novamente surpreendida pelo acaso, resolvi entrar e enfrentar a dor da perda. Após atravessar o grande corredor pálido ocupado por pessoas que encarnavam ainda mais essa condição, quando não no rosto, nas roupas, perguntei por Maria, a minha tão lúcida Maria.

- No box 5 - respondeu-me um senhor carrancudo, de pele enrugada e óculos grossos que impediam qualquer tentativa de diálogo entre olhares. Deve ser mais fácil para eles não olhar nos olhos quando trazem más notícias.

Percorri mais 5 metros procurando pela minha razão, logo a encontrei. Deitada, triste e frágil como não lhe era comum. Respirei fundo, coloquei a mão no peito pra ver se os batimentos voltavam e ensaiei uma frase de calmaria em pensamento antes de lançar qualquer palavra em sua direção. No chão, restos do seu mal estar davam um colorido de tom amarelo pastel aquele lugar tão branco.

- Fica tranquila, meu amor. Você vai ficar bem, agora... - Disse com a voz um pouco trêmula que ainda não havia se recuperado do susto. Ela abriu os olhos pequenos devagar e por um instante pensei ver um sorriso, mais uma vez ela tentando ser forte quando só precisava chorar.

- Minha boca...eu não sinto. - Eu que há tanto tempo não sentia o coração gostaria de estar no lugar dela agora. Amparada pelo silêncio que me é mais conveniente quando desejo falar o que sinto e não o que penso, corri a procura de alguém. Segundos depois, um jovem, de voz forte, cabelos raspados, altura mediana, olhos gentis, veio ao nosso socorro.

- Tudo bem, dona Maria? Eu vou fazer um soro na sua veia agora e preciso que você me ajude fechando o punho direito e segurando até eu pedir que solte. - Ela, apegada a segurança que eles da saúde nos passam quando querem, fez o que ele pediu, sem arriscar uma palavra. Com uma luva cirúrgica, ele amarrou acima do cutuvelo dela e aproveitou a pressão para encontrar o caminho da sua cura. Eu, confiante que estava, apenas observei tentando não desconcentrá-lo.

- Pronto. Agora você tem que cuidar pra não sair da veia. - Ele me olhou com aquele olhar seguro de quem já fez isso cinco mil vezes pra talvez se livrar do meu olhar de insegurança e observação e disse saindo do local: - Qualquer coisa, não hesite em nos chamar. - Agradeci com um sorriso pequeno e me aproximei dela para lhe cobrir a seu pedido.

Depois de vê-la corar um pouco, sentei-me na cadeira localizada a frente da cama e abrir meu exemplar de "A manhã seguinte sempre chega" procurando por alguma crônica que eu ainda não havia lido. Por ironia, li o seguinte trecho: "Sabe doutor, conheci uma menina aí. (...) Já te aconteceu de trombar numa menina assim? Assim, doutor, que te faz voltar a sonhar, então tu hesita porque sabe que o sonho não sairá como tu sonhas?"

Claro que nessa hora eu fechei o livro. Olhei ao redor. Branco e mais nada. Não é por nada que pessoas enlouquecem nesses lugares. Uma enfermeira baixinha e de sorriso largo veio ver como estava dona Maria e aproveitou pra refazer o caminho do soro, pois o outro havia se perdido. Agora, com uma das mãos ligadas aquele caninho transparente onde cai gotinha por gotinha e salva corpo, alma e coração, a cor dela voltava sem que eu me iludisse como em instantes atrás.

O doutor, não o do livro, o que havia receitado duas doses de soro, uma de glicose e mais três combinações de diferentes remédios, também chegou pra terminar de desenhar um sorriso pequeno em meu rosto, pois consigo trazia uma pouco mais de tranquilidade.

Como havia desistido momentaneamente do livro, tentei as mensagens de celular. Falei com algumas pessoas distantes em kms, outras distantes em coração. Também desisti do celular. Achei refúgio na música. Tocava Los Hermanos em meus ouvidos distraídos quando senti um frio nas costas. Logo depois, havia um bilhete com uma letra de forma sinalizando que até nos lugares mais improváveis, o amor acontece. Amor? Bom, meu coração mal havia se recuperado de um susto e já se encaminhava para outro. Que ousadia a dele! E a minha em aceitar. E a nossa em se encontrar.

Agora, a beleza fria de Maria, estava quase pronta para outra. E eu, ainda surpresa pelas coisas que podem te acontecer quando você não está esperando resolvi dar outra chance para o livro, fui ler o final daquela crônica, que dizia assim:

"- Que aparelho é este?
- Um desfibrilador.
- E por que tens um desfibrilador no seu consultório, doutor?
- Porque sou cardiologista, não psiquiatra. E eu posso precisar reanimar o coração de algum paciente em estado de urgência.
- Vou anotar o telefone dela, caso enguice essa tua parafernália aí. Ela também desfibrila corações em estado de urgência. Desculpa a anedota doutor, a gente fica bobo quando está apaixonado."

Foi então que eu percebi. A gente só precisa de um choque. De uma surpresa. Um chute. Ou até mesmo um simples olhar, um toque. Quando você está distraído demais pra notar o mundo gritando ao seu redor a cena pode passar milhões de vezes por você que você não vai parar pra vê-la. Agora, ouse sentir perder alguém que você estima para ver o quão sensível você se torna aos sussurros do mundo. E aí, vem um outro alguém pra te dizer que não é um desfibrilador que vai trazer seu coração de volta, mas o simples ato de te notar quando o mundo inteiro parece não te ver.

sábado, 8 de janeiro de 2011

É bom ter tempo pra pensar nas coisas que você não teve tempo pra rever ano passado. Repensando, eu percebi que isso que dizem do mundo conspirar fez muito sentido no ano de 2010. É engraçado, é irônico, é vida. Como naquela vez em que você apareceu justo quando ele foi me buscar. E eu, com os joelhos machucados demais, não pude fugir, nem dele, nem de você. Você poderia aprender com ele a não me fazer chorar. E ele podia aprender com você a me fazer apaixonar. Mas como só eu conheço os dois, desse meu modo fugitivo e, por isso carente, fico imaginando como seria trocar vocês dois de lugar.

Será que eu ainda teimaria em gostar de você caso você estivesse no lugar dele? Quando eu estou com ele, sinto-me amada, segura, incompleta. Quando eu estou com você, sinto-me amada, insegura, completa. Podia ser apenas uma questão de prefixo. Só que é dúvida. E pior, a dúvida funciona, é a minha sina, diriam outros. Será que não saber se você vai continuar na manhã seguinte é o que me mantém te querendo na manhã anterior?

Eu sabia que iria receber uma mensagem sua quando estivesse com ele. Por isso coloquei o celular no silencioso e na manhã seguinte eu sabia que ainda iria te ter. As mensagens eram como dois avisos, o primeiro, de que você estava pensando em mim, e o segundo, de que após eu as ler, teria certeza de que era você que deveria estar dormindo comigo. Ele é a paz que você me roubou. A certeza do sono durante a noite e não do desejo repentino da madrugada. Juntos são opostos que me distraem. Só que ele me distrai do que eu sinto por você e você me distrai do que eu sinto por mim.