segunda-feira, 18 de outubro de 2010

"Abriu os olhos e o viu deitado do seu lado. O coração, como sempre, pulsou forte informando-a de que alí havia algo, algo que ela conhecia, que sentia, que sabia mas se negava a acreditar. Medo ?! Talvez, não queria muito isso. Talvez receio, talvez fuga de si mesma, talvez raiva da falta de controle para com os seus sentimentos. Controle esse que sempre pensava ter. Mas sentia como humana que era, e não controlava o que sentia, porque sempre acabava chorando sozinha, embaixo das cobertas, no quartinho alugado longe da família. E como se o corpo todo soubesse mas a cabeça, dura, tentasse convencer-se de que não era assim, de que tinha controle, continuou olhando e batendo o coração com aquele que via. Ele dormia pesado, ainda que ela desejasse que as coisas fossem como em um filme onde ele acordaria e a olharia e eles começariam a filosofar sobre os sentimentos e coisas que aconteciam naquele momento. Ela filosofava muito, já ele, dormia. Foi quando um rolo de memória desceu por seu crânio e ela lembrou de cada discussão, cada chorinho rasgado, cada palavra implorada, cada agarrão, cada beijo devorador, cada sermão torto, cada idéia aborrecedora. O filme de seus recentes momentos rodou na tela de seus olhos, recentes demais para o tamanho da destruição, onde naquele dia ele a havia machucado de novo e ela lhe havia pedido pra ficar pois sabia, sempre sabia, ele mentia. Traidor de si mesmo, dizia uma coisa quando sentia outra, e fazia com que ele mesmo tentasse acreditar nas mentiras que ele lhe cuspia. Enquanto ela, mais poderosa, lhe cuspia as tais sinceridades que não sabia esconder por não querer, por não entender, por viver em um outro patamar de vida onde aquilo que ele lhe condenava não existia. "Porque não podemos aproveitar o que temos ?! O que é bom ?!". Era tão simples e ela não conseguia entender como ele não entendia, não via ! Mas tudo era parte do jogo da dor que ele lhe propôs, e que ela participou.


Era ciclo.


Ela dizia pra ele não ligar, ele ligava e ela atendia. Ela dizia que sem mensagens, ele mandava e ela respondia. "Aonde você está ?! Como vai embora ?! Vou te buscar !" "Vamos para a sua casa." "Se importe e me traga um guarda-chuva e meu casaco." "Sem vestígios." "Não gosto de você.". Alí não haviam dúvidas, só certezas. E ela teve certeza ao caminhar de mãos dadas, e descrevia tudo como em uma história alheia a ela, como uma série de TV que lhe doía, por quem ela chorava, ficava destruída ! Ninguém entendia. Eles não entendiam. Mas o imã fazia com que eles voltassem a se juntar. E ele cantava e chorava e ela olhava e pensava porque aquilo, porque ela, porque tudo tinha que ser tão difícil ?! Abdicar o que ?! Liberdade de que ?! Presa a quem ?! Moralismo, falso !!

Como era de costume, ela levantou, se vestiu e saiu andando. Foi embora, como ele detestava que fizesse. Tinha que sair, queria pular nas árvores, beber com os amigos, conhecer gente, gritar !

Foi então que se deparou com um muro. Olhou pra trás e o viu:


- Topa pular comigo ?!

- Topo.

- Topa mesmo ?!


Aquilo foi como um grito ainda que tivesse sido um sussurro, um grito que entrou em seu corpo e a virou de ponta cabeça. Topa mesmo ? Topa mesmo ? Topa... mesmo ?"

Escrito por Pri Fierro - Aquele pedaço de mim que mora onde eu quero me refugiar, lá, bem lá, perto daquilo que eu chamo de fuga e que pra ser de verdade, só se for com ela.

Um comentário:

  1. "Ah, pedaço de mim
    Ah, metade afastada de mim
    Leva o teu olhar
    Que a saudade é o pior tormento
    É pior do que o esquecimento
    É pior do que se entrevar"

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